sexta-feira, 4 de maio de 2007

O PT não vai de ônibus

Archibaldo Antunes

O prefeito Raimundo Angelim cultiva amigos no comércio. Um deles, o dono da Real Norte, acha que esse tipo de amizade deve render ônus à patuléia. Generoso, Éder Pinheiro doou quase 100 mil reais em camisetas à campanha do então candidato petista, segundo notas fiscais enviadas à Justiça Eleitoral. Compradas da empresa Coteminas, do vice-presidente José Alencar, as camisetas vieram de boing. O povo, porém, só vai de ônibus.

Todos sabem que a amizade em torno do poder não é gratuita. Ambos – prefeito e empresário – têm consciência de que favores se pagam. Fiel aos financiadores de campanha, Angelim tratou de avalizar o aumento da tarifa de ônibus, que tunga mais uma vez o bolso do pobre. Também mostrou toda sua gratidão quando no início do mandato resolveu alugar, do amigo José Bestene, o prédio onde funciona a prefeitura.

A atitude do prefeito, camuflada sob as espertezas de quem faz cara de bonzinho ao cometer muitas maldades, revela um PT que se acostumou a tirar dos pobres para dar aos ricos. Uma espécie de Hobin Wood às avessas.

Feito o estrago, percutido nas ruas no apitaço dos estudantes descontentes, escalaram o assessor político da prefeitura de Rio Branco, Francisco Nepomuceno, para falar do aumento. “Carioca”, como é mais conhecido, repisou a lengalenga de que a culpa é da oposição. Atribuiu a Marcio Bittar o alvoroço que pôs em movimento o protesto legítimo. E minimizou o aumento como se o trabalhador brasileiro fosse obrigado a pagar as contas do PT.

Como ganha bem e não anda de ônibus, Carioca ironizou a tunga de R$ 3,90 que os empresários querem aplicar aos estudantes. Ridicularizou também os R$ 7,80 que os trabalhadores terão de desembolsar caso o aumento vigore. Não fez, porém, projeções realistas, já que numa única família pode haver até cinco pessoas que dependem dos coletivos.

Na lógica circense do professor Nepomuceno, Angelim é um herói por ter cortado o aumento pela metade. Era tal o entusiasmo na defesa do prefeito que um desavisado teria pensado se tratar de um desconto na tarifa.

Atribuir a Marcio Bittar a reação dos que se mostram indignados ante o aumento é mais uma sutileza petista. Mas como esperteza demais resulta em desdém à inteligência alheia, Carioca cometeu uma deselegância ao subestimar a compreensão dos que nada tem a ver com as querelas políticas. É no mínimo arrogante achar que a patuléia não distingue quem lhe enfia a mão no bolso, seja qual for o nome que queiram dar à tungada.

Creio, inclusive, que a oposição teria de ter capitalizado sim a refrega, como fez a petelhada a vida toda. PPS, PDT, PSOL, PFL, PMDB e PSDB deveriam ter politizado o movimento, exigindo também que os usuários do transporte coletivo não fossem penalizados pela simbiose entre a Real Norte e a Frente Popular do Acre.

Pois não se trata apenas de se aproveitar do desgaste político de quem tira do trabalhador para dar ao patrão, mas de mostrar que a ética petista, propalada aos quatro cantos deste país, mais uma vez está sendo jogada na lata do lixo da História.

Comentário: o artigo é de fevereiro de 2006, quando a passagem de ônibus passou de R$ 1,50 para R$ 1,75. Mas o tema continua atual, conforme explicado no post aí embaixo.

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